Decadência feminista: de movimento político a engrenagem capitalista

rafaela giovanini
2 min readMar 16, 2020

“Não me kahlo”, “Lute como uma garota”, “Grl Pwr”. Pensamentos extremamente básicos transformados em camisetas, canecas, moletons e até tatuagens. Quando o movimento feminista deixou de ser uma pauta política para se tornar lifestyle e mais uma engrenagem capitalista? Já pensou em quantas horas por dia trabalha a proletária da fábrica que produz 30 camisetas por minuto com esses dizeres, pelo salário de menos de 1% do arrecadado com os produtos?

Hoje, intitular-se feminista é algo simples. Muitas vezes, até uma jogada de marketing, em prol de aumentar o número de seguidores nas redes sociais, é uma válvula de escape. Assim, ocorre um apagamento das pautas do movimento — que inclusive está, aos poucos, perdendo o papel de “movimento”, devido à deturpação dos seus ideais — . O feminismo recorre à raiz da opressão, é abolicionista, é político, é sobre a libertação das mulheres de seu opressor, é sobre luta de classes. Entretanto, obviamente, levantar essas pautas é, pra muitas pessoas sem conhecimento, “desnecessário”, ou dignas de receber um “descansa, militante.”.

Só que o verdadeiro feminismo não descansa. Ele vai atrás das mulheres apedrejadas, em países que reconhecem a Sharia, por cometerem “crimes” sexuais. Não encoraja adolescentes a postarem fotos nuas como “empoderamento”, por reconhecer o quanto isso contribui para a pedofilia. Luta pelas crianças do sexo feminino que são obrigada a se casarem durante a infância. Milita contra a maternidade compulsória. Repugna a violência obstétrica em procedimentos como a episiotomia. Enxerga a opressão presente nas chamadas “barrigas de aluguel”. Procura apoiar as mulheres nigerianas em seus sofrimentos diários. Sente as dores das meninas hinduístas banidas de casa por estarem menstruadas. Se esforça pra não repetir a dor das “mulheres de conforto”, obrigadas a se prostituirem em bordéis militares japoneses durante a guerra. É completamente contra pornografia e prostituição. É inclusivo para mães. É inclusivo pra latinas. Não segue o modelo estado-unidense xenofóbico e não foi feito para virar mercadoria.

Ninguém leva a sério um movimento difundido nas redes como estilo de vida de blogueirinha. Algo autocentrado que tem como objetivo o empoderamento e a autoestima — Fazendo uma comparação real, o feminismo liberal tem sido uma espécie de “coach” para jovens adultas. Além disso, conceitos como childfree, presentes no libfem, são excludentes e perpetuam a segregação feminina.

No final, prende-se um questionamento: Até quando? Até quando teremos nosso movimento resumido, popularmente, a frases prontas e produtos? Até quando a violência ao feminino será perpetuada? Até quando ficaremos caladas, assistindo a decadência do feminismo?

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rafaela giovanini

Apaixonada pela Língua Portuguesa, estudante de Letras na UTFPR, aspirante a jornalista e provavelmente ouvindo Arrigo Barnabé por ai.